sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Álbum de Família


Ironicamente, Álbum de Família (August: Osage County, 2013) se passa durante a reunião de uma família para o funeral do patriarca. Para quem perdeu o pai há menos de uma semana como eu, as comparações foram inevitáveis. Felizmente o encontro da tela tem muito pouco em comum com a situação que estou vivendo. A família Weston do filme é absolutamente disfuncional, composta por mulheres rancorosas e amargas que transbordam ressentimento.

O filme é baseado na peça teatral que desde 2007 tem sido montada com enorme sucesso em vários países e que ganhou o Prêmio Pulitzer de melhor drama em 2008. O autor, Tracy Letts, participou na adaptação do roteiro para o cinema.

Não se iluda. Álbum de Família não é um filme de família. É um filme de terror. Estas mulheres unidas pelo acidente da genética têm muito veneno para destilar durante o encontro, e quando a gente pensa que a reunião atingiu o porão e o esgoto mais imundo das relações familiares, ainda há muito por vir. Nelson Rodrigues ficaria corado.

O elenco é todo de atores e atrizes de primeiríssima linha, e todos têm a chance de brilhar. Há muito tempo não via uma reação da plateia como neste filme, permanecendo sentada em silêncio durante toda a rolagem dos créditos finais - talvez reunindo forças para sair do cinema depois de ter penetrado de forma indiscreta na intimidade mais escura de uma família tão tóxica.

Um dos grandes problemas do estúdio que produziu o filme vai ser escolher quem, entre Meryl Streep e Julia Roberts, vai ser indicada para concorrer ao Oscar de atriz principal e quem vai tentar o de atriz coadjuvante. No papel de mãe e filha as duas protagonizam o filme com desempenhos de emudecer a plateia, mas não há como partir um Oscar ao meio e a única chance de que as duas venham eventualmente a ser premiadas é indicar uma delas como coadjuvante.

Ao sair do cinema todo mundo vai poder ir para casa com a sensação de que suas famílias são as melhores do mundo.

Desculpem a nossa falha em 2013

Como diria a Sandra Annenberg, "que deselegante!"

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Pai

Meu pai era um homem extremamente comum, destes que passariam facilmente despercebidos no meio de um grupo de pessoas. Não foi um super-homem, um mártir, ou uma sumidade - graças a Deus! Deve ser horrível conviver com um monstro sagrado.

Ele tinha um senso de humor incrível, sempre foi muito brincalhão, e antes de a idade torná-lo frágil ele tinha uma animação contagiante. As pessoas sempre esperavam que ele cantasse nas festas, e ele adorava cantar em público. E cantava muito bem. E contava piadas.

Apoiava a família em tudo, sentia grande orgulho de todos nós, e tinha um respeito enorme por nossas decisões. Jamais ouvi dele uma única palavra ou gesto de desaprovação em relação às nossas escolhas - seu apoio sempre foi irrestrito.

A fragilidade trazida pelo peso dos anos o fez mais introspectivo, mas ele nunca perdeu o bom humor. Tornou-se mais meigo, afável, até suave. Saíamos para tomar café, sentar a uma mesa à tarde e ver a população passar, ver o movimento, e eu gostava muito da companhia dele. Ele adorava pastel de carne, empadinhas, doce de leite, e chocolate.

No último sábado ele levantou-se da cadeira, caminhou até o quarto, e caiu morto antes de alcançar a cama. Meu pai tinha 84 anos e deixa uma saudade imensa.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Anta

Tudo bem, ele já foi exonerado do cargo de secretário da Defesa no estado de Pernambuco. Mas o que não cabe na minha cabeça é como uma anta dessas chega a ser indicada e ocupar por algum tempo um cargo desta importância?

Beijando muito


Esta é a foto que provocou rebuliço ao ser apagada pelo facebook no último domingo. O rapaz de turbante é Kanwar Anit Singh Saini, que é descendente de indianos e vive no Canadá, e é seguidor do Sikhismo - uma doutrina religiosa muito comum na India. Kanwar fez a foto durante um evento em Montreal contra a criminalização da homossexualidade e a postou em seguida. O que se seguiu foi quase uma terceira guerra mundial, especialmente considerando que a família de Kanwar já declarou que prefeririam tê-lo matado se tivessem descoberto antes que ele era gay. Às vezes, para aturar um mundo assim, só mesmo cantando Fuck You (Very Much) e beijando muito...

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Living Life With Derek

Quando estiver precisando de um pouco de inspiração, visite o tumblr LivingLifeWithDerek, uma coleção de imagens fofas, lindas, inspiradoras, tesudas, safadas, tudo junto e misturado. É só ir subindo a tela aos poucos, e as imagens não param de chegar.


Se não encontrar nada ali que levante o seu astral, só mudando de planeta...

2013 - o ano em que vivemos em contato



2013 foi o ano em que eu finalmente encontrei mais um excelente propósito para o facebook como rede social. Além de me manter em contato com parentes e amigos que nem sempre estão por perto, estou carregando a rede com informações diárias que estão compondo uma crônica do meu cotidiano e que servirão para me colocar em contato com o meu eu no futuro. Estou transformando meu facebook em meu caderno de memórias. Quem viu o filme Diário de Uma Paixão (The Notebook, 2004) vai entender melhor do que estou falando.

Imagino-me bem velhinho algumas décadas no futuro, utilizando a tecnologia da época para projetar em uma tela ou um holograma todas as lembranças salvadas e poder reviver memórias importantes do passado. Vai ser um passatempo e tanto poder rememorar amigos, lugares, acontecimentos, pequenos detalhes do dia a dia que normalmente se perdem na memória. Acho que vou gostar de ter um canal para reencontrar o meu eu do passado.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Não esconda nunca


Só hoje vi esta imagem utilizada pela Ray-Ban em uma campanha no ano passado, e me peguei viajando na foto por vários minutos. Imaginando a vida nos anos 1940 e como estaríamos vivendo muito melhor hoje se a defesa dos direitos humanos tivesse começado mais cedo.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Uma história dos direitos LGBT nas Nações Unidas

Há três dias o diretório das Nações Unidas para Direitos Humanos lançou um vídeo institucional relembrando as conquistas no campo de direitos LGBT desde que as Nações Unidas adotaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. Não há dúvidas de que os últimos dez anos viram muito mais avanços do que todos os outros 55 anos juntos, mas ainda há muito a ser feito.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Boca a boca


Mais uma campanha contra a homofobia utiliza imagens de héteros famosos se beijando, desta vez lançada pela GQ Alemanha para a edição de janeiro 2014. Apesar de a ideia não ser original, acho ótimo que insistam na imagem do beijo. Não é novidade que a visão da troca de carinhos entre os homossexuais normalmente catalisa reações violentas dos homofóbicos. É preciso inundar o mundo com imagens de beijos.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Filmografia 2013

Hora de olhar para trás e morrer de arrependimento por ter perdido tantos filmes bacanas lançados em 2013. Hora de lembrar daqueles amigos que vivem dizendo que amam cinema, mas que nunca vão. Quantos trechos daqui você consegue reconhecer?

Trocando o óleo

Quem não está adorando o mecânico Jucelino em Amor à Vida, que agora resolveu dar em cima do Félix? Maroto e sempre com um sorrisinho safado no canto da boca ele já deixou claro que "não é gay, imagina que absurdo!', mas que "caiu na rede é peixe" e já tentou levar o Félix para o fundo da oficina. Quem nunca conheceu alguém assim?

Como se o uniforme sujo de graxa não fosse fetiche suficiente, o ator Werles Pajero é uma gracinha e está se saindo muito bem.

Em tempo: há muitos anos eu traduzi um relatório de conclusão de um estudo aplicado no Brasil sobre a disseminação do vírus HIV. Uma das conclusões mais importantes era sobre a necessidade de trocar a redação das perguntas e substituir as palavras "gay" ou "homossexual" por expressões do tipo "homem que faz sexo com homem". A razão era simples: existe no Brasil uma quantidade incalculável de homens que transam com outros homens com frequência, mas que vivem vidas tradicionalmente heterossexuais e não se consideram homossexuais. Isso, obviamente, não é novidade para ninguém - ou você nunca conversou com gente que costuma dizer "eu não frequento 'o meio'"?

Não vejo a hora de chegar logo o futuro quando ninguém vai precisar ser isso ou aquilo, e o sexo vai estar muito mais relacionado com o prazer saudável que pode representar do que com todas as outras neuras que atrelaram a ele. Agora me deem licença que vou levar o carro no mecânico para dar uma apertada na rebimboca da parafuseta.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Fernanda

A Fernanda Lima arrasou no evento do sorteio das chaves para a Copa do Mundo. Linda, simpática, elegante, gostosa - foi unanimidade no mundo inteiro. Menos no Irã, é claro, para onde o sorteio não pôde ser transmitido unicamente devido ao decote provocante da apresentadora. Um sem número de iranianos irados invadiram a página da Fernanda no facebook com ofensas baixíssimas, enquanto outros compatriotas correram para colocar panos quentes e se desculpar pela grossura dos primeiros.

Enquanto era possível para qualquer país viver trancado entre muros e se desligar do mundo lá fora, ainda se conseguia barrar os progressos sociais das sociedades mais avançadas. Mas os últimos cinquenta anos trouxeram a televisão, o celular e a internet, e está ficando cada vez mais difícil para as sociedades mais atrasadas segurarem a barra. A intolerância dos mais atrasados é achar que o mundo deve rodar no passo deles. Fernanda Lima não combina com burca.

53 métodos testados e comprovados para sair do armário


2013 está chegando ao fim e é chegada a hora de passar a régua e ver o que sobrou de saldo positivo. Embora sair do armário já tenha se tornado um ato praticamente banal e desimportante, a forma como muitos famosos e anônimos escolheram para compartilhar esta informação com amigos e parentes tem se tornado cada vez mais criativa. O site Towleroad fez uma compilação das 53 saídas do armário mais intensas e inspiradoras do ano de 2013.

Eu gosto, particularmente, das saídas do armário em discursos na frente de toda a turma do colégio - como no caso do Ted Chalfen ou do Jacob Rudolph. Reuniões que têm tudo para serem maçantes e tediosas, e que acabam se transformando em eventos memoráveis para ninguém nunca mais esquecer.

domingo, 8 de dezembro de 2013

Chegadas


Está causando furor esta história apresentada no Chegadas e Partidas do GNT. Porque esta é a história de todos nós, ou pelo menos a história que muitos de nós já viveram ou gostariam de viver - aquela paixão estonteante que vem e que pega e que não deixa nem você pensar direito.

Meu falecido amigo Hernâni costumava dizer que a paixão homossexual é, via de regra, muito mais forte que a paixão heterossexual. E a explicação é muito simples: é preciso quebrar muitas barreiras e reunir muita coragem para ir contra tudo o que lhe foi ensinado desde criança. Com isso a carga vem potencializada e com tamanha intensidade que tem dias que parece que a gente vai morrer de paixão. Concordo com ele. O amor é lindo, mas a paixão é sublime.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Carrie, a Estranha


Desde quando tomei conhecimento há mais de um ano que estavam refilmando Carrie, a Estranha que fiquei ansioso. Fariam justiça com este clássico do cinema de horror lançado em 1976 com direção de Brian de Palma, roteiro baseado no livro de Stephen King, e com elenco impecável que trazia Sissy Spacek Piper Laurie (que foram indicadas para Oscars de melhor atriz e melhor atriz coadjuvante), Amy Irving, e até John Travolta novinho em início de carreira? Com um grande alívio, a resposta é sim. E em alguns aspectos este remake consegue superar o original.

O filme de 1976 sempre foi um dos meus filmes favoritos de horror. Vi várias vezes no cinema, comprei o VHS, e li o livro na época. A história da garota diferente vitimizada pelo bullying cruel na escola e que se vinga de todos em uma cena apoteótica durante a formatura da turma é de fácil identificação. Quem nunca sentiu vontade de torcer uns pescoços por aí só com a força do pensamento?

Esta versão atual é bastante fiel à versão original. A maior diferença é apenas uma cena extra que constitui o prólogo do filme e mostra o nascimento de Carrie e que não existia na versão original. A história foi modernizada onde possível (as ferramentas do bullying de hoje - especialmente a disseminação de vídeos pelas redes sociais - são mais cruéis e foram transpostas para o filme), mas segue o original quase à risca.

O grande trunfo está no par de atrizes principais. Piper Laurie teve desempenho digno de Oscar em 1976, mas a mãe fanática religiosa feita por Julianne Moore é absolutamente apavorante e real. Coincidência ou não, lembra muito a Shirley Phelps Roper, fanática religiosa da Westboro Baptist Church, que vive de atormentar os gays e todo mundo que quer ter uma vida normal. Julianne Moore está assustadoramente ótima e apavorantemente perfeita no papel.

Ponto também para Chloë Grace Moretz, que já arrebentou a sapucaia em Deixe-me Entrar e A Invenção de Hugo Cabret - entre outros, e que aos 16 anos é uma das atrizes mais promissoras de sua geração. Sissy Spacek tinha 27 anos de idade quando interpretou Carrie e conseguiu passar a ilusão de ser uma adolescente, mas Chloë Grace Moretz obviamente tem o olhar, o rosto, e o físico muito mais apropriados para o papel sem precisar de nenhum artifício para aparentar menos idade.

Hoje eu provavelmente vou precisar dormir com a luz acesa.


quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Rebuceteio

Fiquei ouriçado de saber que no ano que vem a Globo vai apresentar um remake da novela O Rebu, exibida originalmente em 1974. O Rebu foi uma das novelas mais instigantes que já assisti. Para começar, a trama se passa todinha em um único dia durante uma grande festa na casa de um magnata, e na manhã seguinte (quando a gente descobre que houve um assassinato durante a festa), com alguns flashes do dia anterior. Passam-se vários capítulos até descobrirmos quem morreu e a novela toda para descobrirmos quem matou. A estrutura linear da narrativa é todinha desconstruída e as cenas são fragmentadas como num quebra-cabeças, e tudo é feito de forma absolutamente inteligente.

Além disso tudo, a novela ainda tinha um romance secreto entre o magnata (interpretação magistral do falecido Ziembisnki) e um michê (feito pelo Buza Ferraz, também já falecido, lindo na época com 24 aninhos de idade). Tudo na novela transgredia o que já havia sido feito antes.

Não vejo a hora de conferir se vão conseguir refazer a novela com a mesma maestria do original ou se vão destruir algo que na minha memória afetiva ocupa um lugar muito especial.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Gente como a gente


Criado pelo fotógrafo Kevin Troung, o The Gay Man Project cataloga histórias de homens gays em seu habitat natural - do Rio de Janeiro a Paris, do Canadá ao Vietnam. Coincidentemente, a história de hoje é de um brasileiro: Thiago, produtor de eventos, do Rio de Janeiro. 

Eu passei horas viajando pelas imagens e pelas histórias incríveis dessa gente como a gente.