Um editorial sobre a lei da homofobia abre a Folha de S. Paulo de hoje, e eu nunca vi um editorial tão meia-boca feito este. A Folha costuma produzir bons editoriais com posições firmes, mas desta vez pisa no tomate, e feio. O texto, diferente do que já é tradicional no jornal de maior circulação no país, nem está tão bem escrito. Em vez de expressar uma opinião, parece se posicionar sobre o muro. Tenta ter um tom simpatizante, mas no fundo é um baita empata-foda para todos que têm acompanhado o debate.
O artigo alerta que a legislação deve punir os atos de ataques a homossexuais, mas precisa ser equilibrada para não ferir a liberdade de opinião. Confesso que não entendi esta postura da Folha em cima do muro. É óbvio que a liberdade de opinião é um bem precioso que não pode ser ameaçado. Mas o texto traveste de "liberdade de opinião" a permissão que os religiosos querem continuar tendo de atacar a homossexualidade e consequentemente continuar aumentando o preconceito que é a raiz da homofobia.
O artigo fala que se a nova lei impedir as pessoas de consideraram o "homossexualismo (sic) atentatório à vontade de Deus, até a Bíblia teria de ser censurada" - o que eu considero, no mínimo, de uma burrice cavalar. A abolição da escravatura no Brasil aconteceu há mais de um século atrás e a Bíblia nunca precisou ser censurada por falar em escravos.
Primordialmente, o texto incorre em um erro muito básico - esquece da separação que deve existir entre igreja e estado. Leis devem ser dirigidas à população civil de um estado laico. Nenhuma lei pode procurar respaldo na Bíblia ou em ensinamentos religiosos. O artigo peca ao atribuir muita importância à posição religiosa da extrema direita em um debate que é da sociedade civil.
O texto do editorial:
ResponderExcluirLei da Homofobia
Legislação deve punir atos de discriminação contra homossexuais, mas precisa ser equilibrada para para não ferir a liberdade de opinião
Desde 2006 tramita no Senado Federal, depois de já aprovado pela Câmara, o projeto da chamada "Lei da Homofobia", criminalizando atitudes resultantes de "preconceito de sexo, orientação sexual e identidade de gênero".
A polêmica em torno do assunto ganhou intensidade nas últimas semanas. Houve, em primeiro lugar, as justificadas reações de choque e de repúdio diante dos recentes casos de agressão, supostamente por preconceito antigay, de jovens na avenida Paulista. Pressionar pela aprovação da Lei da Homofobia surge, assim, como forma de dar vazão institucional às condenações que o episódio justificadamente suscita.
Reações contrárias ao projeto, contudo, surgem nos setores religiosos, que contam com a crescente influência da bancada evangélica para barrar a iniciativa.
Nos dois lados do debate, há quem se veja vítima de censura e preconceito. O direito constitucional à liberdade de expressão e consciência, sem dúvida, é um dos valores que cumpre reiterar na análise do assunto.
Na verdade, a chamada Lei da Homofobia constitui-se de uma ampliação, no que diz respeito à orientação sexual, de um texto em vigor desde 1989, punindo atos e manifestações de preconceito racial. Trata-se de uma espécie de reforço a direitos de grupos que já encontrariam proteção na Carta e em códigos vigentes.
Há um risco potencial de que a aplicação dessas legislações fira o princípio da liberdade de expressão, embora não conste que ele tenha sido, até aqui, afrontado.
Do mesmo modo, espera-se que ninguém estará impedido pela nova lei de considerar o homossexualismo atentatório aos mandamentos de Deus; até a Bíblia teria de ser censurada, nesse caso.
Depende do bom senso do Ministério Público e da magistratura a aplicação adequada da lei. Há de se considerar, ademais, o excessivo rigor nas punições, que chegam a vários anos de cadeia, em casos que não são de violência física -quanto a estes, sempre foram coibidos pelo Código Penal.
A aplicação sensata da lei, tal como foi redigida, ou a busca de um acordo razoável em torno de possíveis modificações em detalhes do texto, evitariam os inconvenientes reais ou imaginários que se antepõem à sua aprovação.
Mas o bom senso e o equilíbrio são, sem dúvida, as primeiras vítimas quando está em jogo, mais uma vez, a explosiva mistura de sexualidade e religião. Dessa verdadeira neurose do mundo contemporâneo, o Brasil tem-se saído razoavelmente bem, dada a autoimagem, nem sempre confirmada na prática, de tolerância que cultivam seus habitantes.
É essencial preservá-la; mas, a julgar pela celeuma com relação ao projeto, e pelos recentes casos de perseguição a homossexuais, o espectro da intolerância resiste e se renova sem descanso.
Eu sou super favorável à censura da bíblia. Ô livrinho arcaico e incompatível com a nossa sistemática atual.
ResponderExcluirBasicamente, querem preservar o direito ao ódio.
Luciano,
ResponderExcluirMuito bacana seu blog, já está nos favoritos.
Caso goste de literatura dê uma visita no meu espaço.
Besos,
Rico E
É estranho justamente porque lembro que em um outro editorial publicado ainda neste ano eles se disseram favoráveis à aprovação do casamento gay.
ResponderExcluir"Primordialmente, o texto incorre em um erro muito básico - esquece da separação que deve existir entre igreja e estado. Leis devem ser dirigidas à população civil de um estado laico. Nenhuma lei pode procurar respaldo na Bíblia ou em ensinamentos religiosos. O artigo peca ao atribuir muita importância à posição religiosa da extrema direita em um debate que é da sociedade civil."
ResponderExcluirVc disse tudo sobre o editorial da folha ... perfeito
;-)
sempre me impressiono como a religião tem que estar presente em tudo que fazemos. Estou cansado de ver pendurado crucifixos em cima de nossas cabeças que confirmam que fazemos nossa realidade como convém.
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