domingo, 23 de outubro de 2011

The book is on the table

Há um mês entrei no cinema sem prestar muita atenção e só no início do filme me dei conta que era dublado para o português. Hoje, ao tentar comprar ingressos para um outro filme, descobri que só estava disponível em sessão dublada.

As dublagens brasileiras são um trabalho profissional extremamente bem feito. Mas é inquestionável que a dublagem inevitavelmente destrói um lado cultural do filme. Eu até aceito assistir animações dubladas, onde a perda é bem menor, mas em filmes convencionais a perda é, para mim, inaceitável. Filme chinês tem que ser falado em chinês, filme francês tem que ser falado em francês, filme americano tem que ser falado em inglês.

Eu sou de um tempo onde os filmes de cinema eram sempre mostrados no idioma original e dublagem era coisa de televisão. Infelizmente este tempo está acabando. As distribuidoras creditam a nova tendência à ascensão da classe C. Pelo que pude entender, esta "classe C" não gosta ou não sabe ler legendas.

Que classes sociais menos privilegiadas tenham acesso a novas formas de cultura é excelente. Pena é que estas formas de cultura tenham que ser deturpadas para poder ser aproveitadas por estas classes sociais. O problema, é claro, é bem mais profundo. É que eu também sou de um tempo em que as pessoas aprendiam a ler nas escolas.

39 comentários:

Ivan Pavlov disse...

Europeus e americanos detestam ler legendas, não importa de qual classe social sejam. Acho que há uma precipitação preconceituosa em sair culpando de cara a ascensão da classe C e D por algo que tem mais a ver com hábito do que com ter frequentado colégio bom ou saber ler.

Gui disse...

Minha mãe não gosta até hoje.

É realmente, uma pena. Até porque assistir coisas legendadas causam familiarização com o idioma estrangeiro. Enfim.

marta matui disse...

Tudo de ruim que acontece culturalmente hoje em dia é creditado `a classe C...

o Humberto disse...

Post perfeito.Também sou do tempo em que se aprendia a ler na escola -- e nos primeiros anos, não na faculdade da esquina.

Pedro Bitencourt disse...

Confesso que por muito tempo preferi assistir dublado... Mas é inegável a diferença!
Belo post!

Dimas disse...

Sempre preferi no idioma original, mas com legendas, afinal falta muito ainda para conseguir entender a lingua inglesa (talvez na próxima vida).
Aqui no interior do Ceará, nas locadoras (2) só tem filmes dublados, e o problema é que a maioria que aluga é analfabeto funcional - não consegue ler as legendas com a velocidade adequada , além da preguiça- claro!

Raramente alugo filmes aqui, só quando encontro cópias legendadas.

DPNN disse...

Eu sou tradutor, então nem precisa dizer que sou 200% a favor das legendas...

Mas aqui no Brasil até que a gente ainda tem opção de escolher entre legendado e dublado, na Alemanha é tudo dublado, por exemplo.

Anônimo disse...

Adorei alguns comentários, principalmente o primeiro (do Ivan) e esse anterior ao meu (DPNN).

Álvaro Cavalcanti

dino costa disse...

Nos Estados Unidos a gente percebe que quem prefere filme legendado nos cinemas é quem:

1) tem boa formação humanística;

2) tem curso superior, mestrado ou doutorado.

A maioria das pessoas prefere dublado por preguiça de ler ou incapacidade. Outros porque não tem paciência mesmo, ou não tem interesse em ver o que a personagem realmente disse na língua original, coisa da personalidade.

Os cinemas apresentam sim, filmes estrangeiros legendados nos Estados Unidos. Sempre vejo filmes em francês ou espanhol com legendas aqui.

Anônimo disse...

Na França e na Alemanha é tudo dublado. Como lidar?

Lucas disse...

Se os canais da TV a cabo querem se adaptar à classe C ou whatever, que se adaptem, mas que tenham a opção não só do áudio original (nem todos têm) como também de legenda (só achei UM que têm, e só em parte da programação).

O argumento de que em muitos países da Europa tudo é dublado não significa nada. Os franceses preferem ouvir a língua deles no repeat durante 100 anos do que uma palavra do inglês original das séries que eles são viciados. Problema deles. Eu não admito gastar quase 300 reais por mês e ter que assistir programação dublada. Pode ter recebido o ISO 9000 e cu e sustentar 500 dubladores, estou cagando. Quero áudio original.

AD disse...

classe C em termos de falhas virou o "sistema". E o sistema caiu, volte amanhã.

Daniel Cassus disse...

Acho que em Berlim só tem 1 cinema que passa filme legendado no Sony Center. Veja que estamos falando da capital do país! Isso tem mais a ver com a cultura "criada" de legenda (pois cinema sempre foi lazer de classes A e B) do que cultura adquirida por estudo. Afinal, quem vai a cinema geralmente tem um mínimo de alfabetização.

Mas eu fiz um esforço para catar uma das poucas sessões legendadas da animação francesa que fui ver ontem (Um gato em Paris - Une vie de chat). Na sala tinha 2 famílias francesas com seus respectivos pimpolhos aproveitando para ver um filme infantil na sua língua natal, coisa que deve ser rara para eles sem ter que ir ao Cine Maison no consulado. ninguém pensa nos estrangeiros na hora de passar o trator da dublagem, né?

Lobo disse...

Com exceções de animações (e, na minha opinião, algumas dublagens ficam até melhores que no idioma original), não consigo assistir filme dublado. É bem isso que você disse, perde a essência.

É coisa de me fazer desistir de ver filme, chegar no cinema e ver que o filme que quero ver só tem dublado.

Rafael disse...

Eu já deixei de assistir muito filme no cinema pois só estava sendo exibido dublado. Desde criança eu sempre preferi assistir aos filmes legendados.

Quanto às animações, prefiro passar longe da dublagem. Primeiro porque as vozes no idioma original são aquelas que os cineastas escolheram para dar vida a seus personagens, há uma força muito maior nelas do que apenas uma voz que irá substituir a original por ser parecida ou de um comediante ou sub-celebridade da moda. Na animação a personagem nasce ali, com a interpretação do ator, com o texto imaginado pelo roteirista (ou muitas vezes improvisado na hora da gravação. Exemplo clássico é o Gênio que Robin Williams interpretou em Aladdin, a maior parte de suas falas é improvisada), para então o animador utilizar aquela ferramenta para interpretar os personagens no desenho.
Sem contar as inúmeras traduções sem graça ou sem alma como acontece em grande parte do filme. Pra mim, perde-se muito ao assistir filmes animados dublados.

Mas concordo que é preguiça do povo de não querer ler, ou mesmo se interessar por ouvir a língua original. Um dia assisti um filme tailandês e ouvi muitas reclamações e risadinhas por causa da língua diferente. No entanto, isso não acontece apenas no nosso país, já ouvi de muitas pessoas de fora que não assistem filmes estrangeiros (que não em língua inglesa, na maioria), por que não gostam de ler legendas. É a preguiça tomando conta da humanidade.

TONY GOES disse...

Dublagem é um assunto que eu manjom por razões matrimoniais.

Sim, há mais filmes dublados nos cinemas por causa da classe C. Não é "rpeconceito" dizer isto: é um fenômeno sócio-cultural. A classe C está habituada a ver filmes dublados na TV e só agora voltou a frequentar maciçamente os cinemas. A abertura de multiplexes nas periferias mostrou que há um enorme mercado que prefere ver filmes dublados.

Na Europa, a maioria dos filmes sempre passou dublada nos cinemas. Na Itália e na Alemanha é quase impossível ver um filme com o som original: quando existem, não tem sequer legendas!! Na França o exibidor indica se é V.F. (versão francesa) ou V.O. (versão original).

Nos EUA o espectador médio só vê filmes americanso, por isto tem resistência a ler legendas.

Aqui no Brasil e em outros países nos acostumamos com as legendas, que na verdade são uma "agressão" cerebral muito maior do que a dublagem - temos que nos concentrar numa linha escrita na parte de baixo da tela e perdemos parte da ação! mas somos treinados desde pequenos e nos habituamos rápido.

A dublagem, como qualquer tradução, serásempre uma traição ao original. Mas é uma arte e uma técnica, muito mais difícil do que parece ser.

TONY GOES disse...

Ah, outra coisa. Adorei o comentário do DPNN: "sou tradutor, então sou 100% a favor das legendas..."

E quem que ele acha que traduz o texto para ser dublado?

Luciano disse...

@TONY GOES:
Uma observação: a agressão cerebral provocada pelas legendas não é tão grande assim. A primeira regra que se aprende para a aplicação de cursos audiovisuais é que o estímulo visual é muito mais forte e mais complexo que o auditivo. Em resumo: uma pessoa normal consegue olhar para imagens em 5 telas diferentes e processá-las todas, mas não consegue ouvir 5 conversas simultâneas e processá-las todas.
Dividir a atenção entre a cena na tela e a legenda sobreposta a ela é um esforço minúsculo para o cérebro.
Abraço,
**

Fernando disse...
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Fernando disse...
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Fernando disse...

Luciano,

Lots of care quando se fala de "ascenção da classe C". Não é síndrome do "politicamente correto". É que nós, na maioria das vezes, estamos tão inseridos em uma sociedade tão desigual que quase sempre encostamos em argumentos um tanto quanto... preconceituosos quando falamos sobre qualquer tema dessa área. Mesmo sem perceber.

Quem curte filme legendado, na maioria das vezes, tem algum tipo de conhecimento em idiomas estrangeiros, pertence a um determinado estrato social mais elevado e quase sempre um diploma (ou mais) na bolsa. Além disso, é um fator majoritariamente cultural: na Alemanha, cinemas em idioma original são raríssimos (em Hamburgo só tinha UM - caríssimo e com a programação mais blockbuster que você poderia imaginar) e mesmo as TV's a cabo fuderosas vinham 100% dubladas - sem a opção "idioma original" como na NET ou Sky (resultado: o único canal legendado era a MTV, e eu sei te dizer o que aconteceu em todos os episódios de "Paris Hilton: The new BFF" e "Rock of Love").

Portanto, let's go slowly. Que bom que tenha gente que esteja indo mais ao cinema, nem que seja para ver dublado. Se estamos questionando que a atual classe C não saber "ler", então que passemos a meter o pau no sistema de ensino atual. E não na ascenção da classe C.

Beijos,
Fer.

varzo disse...

Bom, independentemente de que lado está o comentário de nossos colegas, todos são unânimes em uma coisa, o problema é cultural. Mas acredito que o texto queria simplesmente mostrar que o problema aqui é a preguiça mental ou pior, a alfabetização que a cada dia piora. Alguém levanta bandeira junto aos professores por um salário melhor ou melhores condições de trabalho ou ainda treinamento? Então, em vez de dar melhores salários damos filmes dublados. Simples. Agora, me perdoem os comentários sobre, mas acho muito simplista e um atentado a inteligência de qualquer um fazer comparações entre países culturalmente tão diferentes com falsas premissas. Cada país tem seu motivo e seu orgulho. Apesar que uma coisa certa, no final, se é por preguiça, por analfabetismo, por submissão ou supervalorização de outras línguas/culturas, estamos todos culturalmente condenados em massa ...

varzo disse...

ah, outra coisa, hoje em dia chamar estes filmes que somos bombardeados como cultura é forçar a barra demais, não acham?

Luciano disse...

@Fernando:
Quem falou que o fato se deve à ascensão da classe C não fui eu - foram as distribuidoras (o link está na postagem, em amarelo).
E meter o pau no sistema de ensino atual é exatamente o cerne da postagem, que termina com a frase: "eu sou de um tempo em que as pessoas aprendiam a ler nas escolas".
A minha intenção com o texto foi exatamente externar a minha frustração com um sistema de ensino decadente que, na minha opinião, puxa todo o nível cultural do país para baixo.
Abraço,

Fernando disse...
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Fernando disse...
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Fernando disse...

@Luciano: Mas você linkou o texto e reproduziu a mensagem dele no seu post. O que fica para o leitor é que no mínimo você concorda e toma como seu o argumento dado pela reportagem da Folha (que, sinceramente falando, é a nova Veja: pega declaração, corta dali, estica daqui e coloca no página principal com o título mais polêmico possível). A reportagem, do meio pro final, até questiona a limitação tecnológica das operadoras TV a cabo em oferecer um sistema dual (que permitiria assistir os filmes legendados e dublados) - mas a mensagem que fica é o maldito argumento da "ascenção da classe C". Duvida disso? Dá uma olhada no tom dos comentários do artigo no site da Folha.

A minha intenção com o comentário foi externar a minha frustração para o fato de que passamos tempo demais discutindo os efeitos negativos da "ascenção da classe C" (Filmes dublados! Funk tocando em todo lugar! Orkutização do produto X!) quando isso é um processo... que não tem volta. É isso e ponto final. A questão é que a sociedade brasileira como um todo se tornou superficial e simplista - e isso tem raízes muito mais complexas do que na simples ascenção de um grupo social.

Afinal, não custa nada lembrar que no "seu" tempo, o Brasil era um dos países com maiores índices de desigualdade de mundo e seguramente com um índice de analfabetismo bem maior do que o atual. Que bom que você tenha aprendido a ler.

Beijos,
Fer

Ivan Pavlov disse...

Fecho com o Fernando e não abro.

Escrever que "pena é que estas formas de cultura tenham que ser deturpadas para poder ser aproveitadas por estas classes sociais" é, sim, afirmar que a classe C está "orkutizando" a cultura. Aliás, até quando as pessoas vão insistir de que não existe cultura melhor, maior? Gente que se diz letrada, estudada, cheia de títulos e ainda (des)qualificando cultura? E ainda fala mal da classe C por preferir filme dublado? Tá parecendo o tradutor acima que deve achar -como bem pontuou um comentarista - que dublagem não é tradução (como ofício), deve achar que o dublador chega na hora e improvisa.

Como disse a colega lá em cima, agora o bode "respiratório" é a classe C, a "elite branca" vai afogando em sua própria arrogância culta.

Ivan Pavlov disse...

Corrigindo: "até quando as pessoas vão insistir de que existe cultura melhor, maior?"

Anônimo disse...

Adoro South Park dublado: "Filhos da puuuuta!"

Thiago Lasco disse...

Confirmado: virou tabu falar qualquer coisa sobre a classe C!

Daniel Cassus disse...

Tabu não virou, mas virou a forma mais fácil das outras classes deixarem escapar aquele fiapinho de preconceito que elas acham que não têm mais.

Eu mesmo ainda tento me policiar. Não sou perfeito. Mas encaro exatamente como o Fernando. É um processo sem volta se é a desiguladade social que pretendemos combater neste país.

Fernando Sobrinho disse...

Bom para a tal Classe C que os cinemas têm exibidos mais filmes dublados. Como a maioria dos filmes exibidos em shopping centers não é do meu interesse, sofrerei mesmo é no dia que resolverem exibir cópia dublados dos filmes de von Trier, Almodóvar... O som do idioma original faz parte da minha apreciação de cinema.

Eu posso falar mal da Classe C porque venho dela,rs.

Fernando Sobrinho disse...

* "cinemas têm exibido" e "cópias dubladas".

Dá-lhe Classe C,hehe.

Anônimo disse...

Como disseram antes, não dá para nivelar por baixo, tem que nivelar por cima mesmo.
O Brasil sempre foi acostumado a ter filmes legendados no cinema, tem que continuar assim.
Senão depois acaba como na Espanha, o sindicato de dubladores é tão forte que é quase impossível acabar com o monopólio deles.
E a dublagem custa horrores para ficar pronta, o filme demora um século para estrear.

Chiquinho disse...

Lindos tempos, a classe C não pede mais, ela manda! Odeio dublagem, as vozes são tediosas e superclichê nos sotaques ora RJ demais da conta, ora SP além do limite suportável.

Anônimo disse...

Exclui o Fernando tb, kkkkkkkkkkkkk.

Anônimo disse...

Esse Fernando eh muito pe no saco viu!!!

railer disse...

ótimo texto, luciano.

outro dia caí nessa também, de entrar achando que era legendado e ser dublado. na verdade o jornal dizia ser legendado. era o único cinema, longe pra caramba. lá fui eu. junto com toda a galera da sessão, ficamos decepcionados.

dublado no cinema só curto desenhos.

quanto à qualquer pessoa que prefere dublado, acho também que é por preguiça de ler.