Entrou em vigor hoje na França a polêmica lei que proíbe que pessoas saiam em público com o rosto coberto de forma que não permita identificação. Divulgada erroneamente como a "lei contra o véu islâmico", a lei não tem nada contra religião ou seita nenhuma, mas sim a favor da clareza e facilidade de identificação individual num mundo que se tornou perigoso demais. A lei não é contra quem se cobre, mas a favor de quem não tem o que esconder.
Eu entendo perfeitamente que pessoas estejam se debatendo pelo direito das mulheres permanecerem cobertas, seja por princípio religioso ou pela simples liberdade de expressão. Mas todo país é soberano para definir códigos de vestimenta que ache mais adequados para a decência e segurança de seus cidadãos. Os países dominados por religiões ultra conservadoras, exatamente de onde se originam os cidadãos que protestam contra a lei na França, também têm códigos bastante severos de vestimenta. Uma mulher ocidental usando minissaia, calça justa ou blusa decotada em um país destes seria presa, açoitada em público, humilhada, e deportada. Não acho, portanto, que os seguidores de religões ultra conservadoras estejam em posição de protestar contra qualquer código de vestimenta em um país laico.
Imagens de câmeras em lugares públicos já se tornaram um recurso essencial no combate a crimes e atos de terrorismo. Mas o sistema não funciona se todos estiverem cobertos e impossíveis de ser identificados. Andar com a cara à mostra virou um mal necessário nos tempos atuais.
16 comentários:
"Os países dominados por religiões ultra conservadoras, exatamente de onde se originam os cidadãos que protestam contra a lei na França, também têm códigos bastante severos de vestimenta. Uma mulher ocidental usando minissaia, calça justa ou blusa decotada em um país destes seria presa, açoitada em público, humilhada, e deportada. Não acho, portanto, que os seguidores de religões ultra conservadoras estejam em posição de protestar contra qualquer código de vestimenta em um país laico."
Isso sozinho já encerra a questão.
Mas ainda tem o argumento do último parágrafo que também é essencial. Boa!
Bem-feito! Quero ver doentinhas de burca se racharem no próprio preconceito! Sim, tem mulheres islamitas mais xiitas e fundamentalistas que muito homem e são as primeiras a fiscalizar as outras e recomendar chicote para as que não andam como bichos-papões de negro pelas ruas... Em algumas custa crer que ainda tenham olhos pra enxergar alguma coisa diante de si tamanho rigor da vestimenta... Excessos, excessos... Adorei atitude das autoridades francesas, como sempre à frente do resto do mundinho, já diria minha ídola Odete Roitmann.
Resta saber por quanto tempo a França e a Europa como um todo vão permanecer "laicos".
Esse argumento do "se você não fez nada de errado, não tem o que temer" anda muito em voga em estados totalitários.
Mas vamos deixar de hipocrisias, né? é uma lei contra a islamização da europa. A frança só não vestiu a carapuça (o véu) como fez a Suiça que proibiu os minaretes.
Fato que estamos vivendo numa guerra de culturas. O ideal seria que nenhum país tivesse que proibir ninguém de usar roupa nenhuma, seja ela um véu ou uma minissaia. E que as pessoas também tivessem noção na hora de se vestir, mas aí a discussão já entra na seara da moda.
Eu sou bem mais conciliador: quem quiser ser islâmico radical, usar véu e etc que se mude para um país que siga a sharia no oriente médio.
Entendi...
Luciano, isso é uma questão extremamente complexa que ultrapassa a questão do próprio véu, principalmente na sociedade francesa. Começa em como os países europeus construíram suas identidade nacional (com os seus 'mitos' de pureza nacional, que absurdamente separam eslovacos de tchecos ou luxemburgueses de flamengos), passa pela falha que TODAS as sociedades européias apresentam em integrar efetivamente seus imigrantes aos valores nacionais e termina na dificuldade dos europeus em lidar com o fato de a Europa moderna não é a Europa do início do século XX que exportava sua classe mais baixa para Argentina e Austrália, homogênea nos seus valores e tradições.
Concordo plenamente que "em Roma, como os romanos". Mas até que ponto a sociedade francesa efetivamente é o que o Palácio do Eliseu e o 16éme parisiense enxergam? Qual a necessidade se aplicar uma lei tão polêmica, se a educação na França é universal e gratuita, e obviamente esses imigrantes em algum ponto passam pelo sistema educacional francês? Será que realmente essa não é uma forma de segregar e tratar de forma desigual pessoas que necessitam ser efetivamente integradas a sociedade francesa?
Todo país europeu se questiona o que será daqui pra frente, com a intensa onda de imigração que eles vivem (e não sejamos hipócritas, porque os europeus não estão sendo bonzinhos com ninguém: são os imigrantes que lavam os banheiros, limpam as casas e escritórios, trabalham nos Mac Donalds - fazem todos os empregos que os europeus se RECUSAM a fazer). Antigos bastiões da tolerância, como a Holanda e Dinamarca, estão se tornando cada vez mais xenófobos (conheço um caso de uma dinamarquesa que se casou com um egípcio... e o governo dinamarquês negou o visto de residência para o cara porque julgou ele 'incapaz de integra-se a sociedade dinamarquesa'. O casal foi morar em Malmö, do outro lado do estreito de Öresund, onde em 2 tempos o egípcio conseguiu visto de residência pelo governo sueco). A questão é como os grandes (Alemanha, Reino Unido e França) vão lidar com essa questão: ainda ficar sonhando com uma Europa homogênea (e baixando leis democráticas e tolerantes como essas) ou efetivamente reconhecer que a realidade mudou e que a identidade nacional de cada país necessita ser flexibilizada para que seja normal pensar em um sueco loiro ou negro, ou um francês com traços tipicamente gauleses ou mediterrâneos.
@Fernando,
Seus comentários são muito pertinentes, concordo com tudo. Toda esta teoria de integração faz muito sentido e é muito bonita a longo prazo. O problema é o que fazer com o problema da segurança na semana que vem.
O Daniel também está coberto de razão quando fala no temor da islamização da Europa. O temor é concreto e tem muita razão de ser.
Abraço,
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É muito pano pra manga!!!!!!!!
Como eu imaginei, muitas mulheres muçulmanas protestaram ontem na França pelo que chamam de 'direito' a continuarem vivendo asfixiadas debaixo daquelas camadas de pano... Vá entender... O governo francês foi muito correto e deixou claro que não tem intenção de mudar toda aquela indumentária pavorosa e sim deixar o rosto de quem quer que seja - inclusive o das mulheres - à mostra para fins de coerção do terrorismo e estipulou multa ainda mais salgada para os 'donos' dessas mulheres que as impedirem de fazer isso, resta saber se isso não vai acirrar os ânimos dessa gente louca do Oriente Médio, afinal tudo é estopim pra guerra santa... Meda desse povo...
@Luciano: Todo mundo na Europa sabe que quem quiser fazer um ataque de larga escala é só deixar uma bomba em qualquer grande estação do sistema de metrô de qualquer cidade média na Europa - na Alemanha nem catraca as estações tem, quanto mais segurança para vigiar quem entra ou quem sai. Nem os americanos, psicóticos com segurança como são, cogitaram estabelecer uma lei tão polêmica como a lei que o governo Sarkozy aprovou.
A grande verdade é que:
1) O Sarkozy está desesperado porque as eleições estao chegando, seu índice de popularidade está no chão e a Marine Le-Pen cada vez mais aparece como fortíssima candidata num país que gradativamente caminha para um conservadorismo e xenofobia completamente incompatíveis com tudo o que a França defendeu historicamente (custa lembrar a história dos ciganos deportados para a Romênia, caso inédito de deportação maciça de um grupo de um país para outro da União Européia).
2) A lei problematiza os muçulmanos, insiste na questão de que o Islamismo é o problema - o que pode ter um perigosíssimo efeito de aumentar ainda mais o fosso da discórdia entre os 'gauleses' e os franceses filhos de imigrantes. Infelizmente o que na Alemanha é completamente inaceitável de se falar (qualquer discurso mais xenófobo), em território francês é absolutamente aceitável e corriqueiro.
3) A França tem um sério problema em integrar a classe de imigrantes. Enquanto na Inglaterra e Alemanha, pode-se até se falar em uma classe média negra/turca, na França os magrebinos ainda estão maciçamente concentrados nas castas mais baixas da sociedade. Isolamento social + falta de aceitação dentro do conceito de "ser francês" = Aproximar a realidade que mais se identifica, que nesse caso seria a religião.
O Estado deve ser sempre laico. É muito perigoso quando o Estado se une a religião. Tenho medo que iso aconteça no Brasil com esse evagélicos. Mas a decisão da FGrança realmente é polêmica e contra o que se espera do povo francês, mas entendo que no mundo atual, onde o medo ao terrorismo impera essas leis se façam necessárias. Talvez nada impeça, mas dá a falsa sensação de segurança.
É isso aí: não tem argumentação melhor que essa do seu post!!
Abraços!
Luciano, sempre acompanho seu blog e nunca tive uma oportunidade de elogiá-lo antes. Gostaria de deixar isso claro antes de iniciar meu post, pois nao quero parecer um bobo que quer chamar a atenção sendo o "do contra". Mas eu vou concordar um pouco com o Fernando, discordando um pouco do seu texto. Embora não ache correto uma mulher usar véu, embora ache que isso a escraviza e a põe num papel de submissão, temos que tomar cuidado, pois estamos defendendo o direito das pessoas serem o que elas quiserem ser. Estamos aqui falando em respeito ao diferente. Ao que nos choca, ao que nos parece inaceitável em termos de comportamento humano. Explico: se para aquele grupo de mulheres o véu não representa submissão? E se representar, e ainda sim, elas optarem por usá-lo, como símbolo dessa dominação? Temos que banir, então, os casais adeptos do SM a se vestirem seguindo seu dresscode. Temos que banir qualquer símbolo feminino que represente submissão. Essa lei aparece num momento crucial para o cruel, covarde e nazista governo Sarkozy: o momento das eleições (como bem pontuou o Fernando, não me cabendo explicar de novo). Neste momento vivo como imigrante na França. Ainda que seja um imigrante legal, com documentos e já com prazo de volta, percebo a hostilidade no ar. Nunca poderia imaginar que a terra da Liberdade-Igualdade-Fraternidade fosse preconceituosa, como realmente é. Sarkozy conta agradar seu eleitorado com esse negócio insano de "identidade francesa". Se você perceber bem, Godard, Saint-Laurent, Camus e tantos outros que fizeram seus nomes na França, são considerados franceses, embora não tenham nascido em solo francês. Já os inúmeros franceses de nascimento, de origem estrangeira - sobretudo - são tratados como árabes, africanos, ou outros nomes que adquirem coloração racista e são bastante nojentos.
Acho perigoso, portanto, darmos qualquer tipo de apoio a uma lei como esta. Estabelecer uma espécie de "vingança" contra os estados teocráticos também não é a coisa mais inteligente de se fazer. Se lá eles têm leis que nos causam revolva, melhor nos afastarmos cada vez mais, ao invés de providenciar represálias, para que eles se sintam ameaçados. Criar uma lei que puna um crime sem vítima é um retrocesso de séculos na legislação francesa e só tem um objetivo: angariar votos de franceses. Sarkozy conhece seus concidadãos. Eles podem muito bem não tolerar cortes na Educação, na Saúde e ver seu plano de seguro social ruir. Mas eles aceitam e gostam muito de um governo que os separe e os trate como superiores. Isso abre precedentes para um estado totalitário disfarçado de democracia. Quem serão os próximos a serem regulamentados para que se adequam ao 'modelo francês' de vida? Por acaso eles, durante séculos de colonialismo, respeitaram ou viveram conforme o hábito reinante da colônia? Não, sempre a mesma pretensiosa eurocêntrica dominadora. Acredito que uma das maiores lutas deste seu excelente blog (favoritado e lido todos os dias por este que escreve) é exatamente a extinção da visão centrista e normativa de valores da nossa sociedade. Abraçar esta causa é sorrir para uma forma de discrimação.
@Élvio,
O assunto é, sem dúvida nenhuma, muito complexo. Eu vivi e trabalhei bastante tempo na Arábia Saudita, e escrevo como alguém que viveu aquela realidade pelo outro lado. Acredite-me: é assustador.
Abraço,
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